o meu pé de jabuticaba

era uma vez um menino e seu pai, que em um dia de sol plantaram em meu ao roçado duas mudas de jabuticabas, que cresceram para nos natais acolher em suas braços inúmeras crianças, que em seus troncos anotavam dizeres muito simples.

Carta à minha irmã

Minha irmã....
Agora é uma noite quente, muito quente, daquelas em que mosquitinhos voam em círculo em volta da lâmpada acesa. Voam como as aleluias dos postes velhos de nossa infância, que voavam na calçada da Dona Regina, a velha que furava as bolas arremessadas em seu quintal.
Isso já faz tempo, mas um tempo tão miúdo que passa rápido, daquela época dos uniformes brancos das EEPSG’s, que desfilavam harmônicos pela rua alagoas. Turno dos que vinham, e daqueles almoçados se iam.
Naquela época, tão distante na memória, não me lembro bem de muitas coisas, lembro mais das cores rosadas do pôr-do-sol, do barulho quente da panela de pressão e das modas de viola que soavam pelos nossos quintais.
Lembro dos livros roubados na estante, com os quais aprendi a gostar das histórias. Minha irmã que voltava para a casa com a mochila cheia deles, roubados da biblioteca e que ainda hoje bebem o pó de minha prateleira longíqua.
Nesse tempo não havia heróis, havia apenas irmã mais velha. Suas calças xadrez e all star multicoloridos. Não era preciso mais nenhuma crença que a rebeldia emprestada do mais velho, e assim criticávamos em volta da mesa, ou sentados na varanda as estruturas sociais, as roupas da moda, o hino da igreja, a vizinha da frente.
Houve um tempo em que me ausentei para orar. E em uma vida tão pequena como foi até hoje a minha, lamento o tempo adolescente perdido ao lado de minha irmã. Mas enquanto eu orava por detrás de grades beges, ela pensava em mim e esperava meu retorno para casa.
Não tardei a voltar. Não me lembro bem o dia que era. Não me lembro as cores desse dia. Nem a música que tocou durante o almoço. Não me lembro da despedida. Lembro apenas que voltar doía tanto quanto ir.
Mas aos poucos, de mãos dadas com a irmã mais velha, aprendi os segredos dessa vida. A tomar a cerveja nos fins de semana, a fumar o cigarro em leves tragadas, a amar de novo os homens.
E se por acaso tive que partir de novo, com o coração apertado em idas e vindas, nunca mais soltei as mãos das mãos dela.
Ninguém sabe, nem nossos maridos eternos, nossos grande amores, nem a mãe e a memória do pai, talvez nem os filhos que teremos, que neste mundo não existe amor maior que o amor de irmão.
Minha formação católica me faz sentir um pão partido. Nunca fui o pão inteiro, sempre fui a metadinha caçula, partida, farinha igual, a parte maior.
E como dói a saudade de estar longe, e grita a vontade de correr os quilometros bobos que se erguem entre nós.
Mas estou voltando de novo, para a minha casa, meu quintal, minha varanda....para as doces memórias de uma infância colorida, com cheiro de café e pão. Uma infância pequena e pobre, regada pelo amor de pais, que do nada que tinham, tudo nos deram.